quarta-feira, 26 de abril de 2017

Campo florido

Flores cinzas, brancas, negras e opacas
Cobrem os jardins de vãs esperanças
Deitadas eternamente sobre férreas placas
Enquanto suas irmãs jogam-se às danças

Pequeninas flores, por que não desabrocham?
Já passou a primavera, tantas primaveras...
Suas irmãs já são árvores agora, sabiam?
Já não lembram de vós, mas são tão bonitas...

Pequeninas flores, por que não têm nome?
Por que ficam mudas há tanto tempo?
Florezinhas, por que sua cor some?
Por que me ignoram? Me deixam ao vento?

Ora, florezinhas, saiam logo desses vidros!
Estou a falar sozinho? Não me respondem mais...
Parem de nadar, pequeninas. Corpos tão rígidos
Meu Deus, serão as flores mortos neonatais?!

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Prisioneiros

Desde o nascimento o cárcere está presente. Ligados ao útero sem opção, pois a sobrevivência depende disso. O primeiro respirar é a algema que nos prende pelo resto da vida, uma prisão maior, mas ainda uma prisão.
A cada dia se torna pior e a cada dia mais correntes se enrolam e apertam. E o carcereiro é a própria vida que açoita os homens com o chicote do tempo. Homens que se libertam tornam-se moribundos, pois fora do cárcere nada mais há.
Infelizmente assim pensam os homens, pois, ao olhar pelas janelas de ferro não veem além. Uns poucos roubam as chaves e fogem; menos ainda conseguem verdadeiramente ser livres.
As chaves somos nós, só os que percebem tal coisa escapam. Enquanto não abrirmos os olhos, os açoites da vida continuarão a nos sangrar e a nos deixar marcados. Muitos abrem os olhos apenas na morte, mas então já é tarde demais.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Guerra Média

Travando batalha constante
Correndo entre morte e vida
Morrendo a cada instante
Lembrando de sua partida

Oh soldado de sina maldosa
Oh leal servo da saudade
Por que não vais ao Árcade?
Lá está sua deusa curiosa

O hálito da morte permeia o ar
Apodrece o vivo que chega
Tétrica face faz encantar
Nos campos de ferro não nega

Memórias esquecidas e submersas
Em conserva nas câmaras do amanhã
Lute, guerreiro, contra as desavenças
Desconhecido poeta, alma sã

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Prima dos sonhos...

Meu amigo de longa data
Por anos te acompanho
Minha índole é exata
E para ti não sou estranho

Sei que vem sofrendo há muito
E a culpa cabe a mim
Perdoe o meu descuido
Mas prometo à sua dor dar um fim

Sou amigo, não carcereiro
A vida é o cárcere, eu o vigia
Porém sou eu o carniceiro

A todos liberto, mas é antropofagia
Dentre os sofredores, sou o primeiro
Por isso vos devoro com toda alegria

domingo, 2 de abril de 2017

Desabamento

As tristezas que alejam
As dores que torturam
O tempo que não passa
É incrível que não se esqueça

O alento nunca vem
E apenas a máscara se move
O interior está aquém
E no espírito apenas chove

O esquecimento não chega
Mas aos poucos desaparece
E a mente torna-se cega

O espírito aos poucos perece
A casca resta e não nega
Onde está o homem que à casca pertence?