segunda-feira, 12 de novembro de 2018

XII

Não sinto o ódio...
Não sou capaz de odiar
Toda vida é vida
Todo ser é humano.

Pérola funesta

Ah, a luz da Lua...
O grande astro-reflexo,
ilumina a vida crua
e o ser a ela anexo

Brilha nos olhos de cada ser
Movimenta a vida sob si
Se na existência ela faz valer,
Na destruição, ela sorri.

Voam as brasas até o céu 
Pequenos brilhos que se confundem
numa profusão impregnada de fel
E, como as estrelas, a nós iludem

Cacos jazem cobrindo o chão
Fumaça escurece a tétrica escuridão
O fogo consome até mesmo as estrelas
Enquanto corrói as duras prateleiras

E correm os homens em desespero
Para fora e dentro desse espelho
Não aprendem, a Guerra não cessa
Tal destruição não há o que meça

É a História que arde sob ao Céu
É o Futuro que aqui se enterra
A fumaça faz de si o véu 
Que alenta o homem que berra

É a própria Humanidade que arde
E no espírito dos bons faz alarde
Morreu assim a Esperança,
Com tristeza, desprezo e desconfiança.

X

Amanheci com minha cidade envolta em névoa
Pensei ter sonhado tanto que acordei nas nuvens

IX

Sim, eu penso no que vou escrever
Mas antes não pensasse.
Antes corressem os versos livres
como um corcel das estepes.
Uma pena não poder ser livre...

Tempos Modernos

Se digo aipim, forçam macaxeira
Se digo que sim, faço asneira.
Pois se penso que não,
me descem a mão.
E urram orgulhosos, de peito cheio
que sou violento, fruto do meio.
Bem poderia baixar a face, não discordar...
Mas ora! Qual a graça de viver sem acordar?

VIII

Morte aos intolerantes!
Que o Estado nos liberte!
Que a pobreza enriqueça!
E pra vida nunca desperte.

VII

Fingem a igualdade
Defendem a bondade
Mas tratam da liberdade
Como ferida que arde

VI

Sabe, sangra a memória aqui...
Todos rugem a história
Imersos num quadro de Dalí

L6

Se escolho a carne devorar
No sangue permito banhar
Na vida d'um outro qualquer
Que a própria vida não soube viver

L5

Sangra o ferro e escorre vida
Dá-me de beber da tua ferida
Enquanto sugo a fila vermelha
Projetada além de tua veia

Vivas tripas imersos no sangue
Azuis, vermelhas e amarelas
Donde jorra o rio que lambe
em ondas de dor além das telas

Grita como o demônio
que está a lhe devorar
Se não gritar, me deixe apreciar
essa tua vida antes que torne amônio

Para mim não é tortura
se te trato com tamanha ternura
Amo-te ao ponto de guardar em mim
tua vida, tua carne, teu espírito, sim.

L4

Afasta-te ou devoro-te!
Com teu corpo podes ficar
Pois só me interessa tua alma
Consumir tua mente, apagar o olhar
Quero comer o brilho de vida
Quero tomar para mim teu sorriso
Meu prazer está em viver matando
Meu morrer está em matar vivendo
Não se preocupe, não te deitarei aos vermes
Em mim estará sempre vivo
Levarei em minha existência a tua também

L3

Sinto o sangue correr meu corpo
Para agarrar-me à carne do morto
E sentir dele o sangue correr
Para minha garganta, gerando prazer

O ferro rubro oxidado
Em rio suculento me foi dado
Macios são os músculos rasgados
Outrora fortes, jazem acabados

A luz de olhos antes vivos
Ilumina agora meus intestinos
Saboreio a vaga vida restante
No ser que arqueia ofegante

L2

Corre, pequeno ser.
Corre! Dá-me o prazer!
Amo ver-te a correr
Amo ver o desespero crescer

Desvia de mim a todo custo
Soca, esfaqueia meu rosto
Tenta de toda forma me matar
Para assim tu poder sossegar

Porque se assim não fizer, eu farei
Estou morto em mim, eu sei
Por isso me alimento da vida
Que, porventura, agora é de sua lida

Mas logo será inteira minha
Sou eu a lâmina que corta a linha
Aquelas três velhas nada sabem
Devorarei vida a vida até que me matem

L1

Se está preso, quebre a corrente
Se não puder, arranque o braço
Devora então o carcereiro
Devolve à morte a vida que o criou
Destrói a pedra dos arredores
Faz explodir no peito a ira
Liberta de si a própria mentira
Acaba com o mundo se puder
E, se assim for necessário, da aos vermes o que comer

Alexandria

Arde, minha Alexandria...
Desaba, minha agonia...
História nunca tivemos,
vide o presente que vivemos.
Haja esperança!
O futuro na criança?
Jamais.
Não mais...

Out-rubro

É demais esperar o mínimo do gênio humano...
Não aprendem com o passado,
não se importam com o futuro.
Mais vale a forma que o conteúdo.
Pensaram mesmo que havia acabado o Parnasianismo?
Escolhem aparências e individualidades
enquanto bradam sobre inteligência e igualdade.
Atingir a paz pela guerra, a tolerância pela intolerância.
E tamanha é a hipocrisia que nisso veem justiça
Me pergunto quanto mais irá durar
a aventura humana sob liderança "popular"

Conversa de setembro

Minha fronte arde também
Como se espalham as chamas, meu bem...
Ah mas que tristeza que me dá
Só me resta mesmo orá
-Então é sumemo, seu dotô?
-Esse fogo num procupa o sinhô?
-Me entriste demais da conta, seu Tião.
-Nosso futuro tá queimando, meu bom...
-I comé que faiz agora?
-Si nois já nem tem história...

P5

Face a ti, criador
Cá estou. 
Faz-se a ti, criador
Morto eu sou.

P4

Olhe para mim.
Encare tua criatura
Nunca fui vivo
em minha essência
Nunca escolhi
o ardor de viver.
Ao contrário, sou frio.
Pedra mármore,
pedra pomo.
Nada além de um belo
e sublime
Sarcófago.

P3

Na aurora da vida surgiu
Pouco a pouco soergueu
Edifício dos pesares eternos
Mímese do seio materno
Casa dos desvaecidos
Orgulho do menino caído

P2

Se esquece do peso do mundo
Sobre os ombros, sempre mudo
Fixo, imóvel, imortal
Antes fosse pedra o gigante mental

P1

Sob o manto de uma vida
escorrem lágrimas.
Correm e se escondem na pedra
Donde racha a rocha
um inteiro rio surge
Não bastasse sua fúria
A voz do menino ruge.

XIII

Te viste, sonhador?
Oraste, pecador?
Acorda antes que vá
meu pensamento há
de acabar après de ça

XIV

A pessoa à minha frente um dia esteve também viva. Um dia ela amou, para no outro odiar. Um dia ela sorriu, para no outro poder chorar. Um dia desejou morrer, para no outro querer viver. Um humano como qualquer outro, como qualquer um de nós. Viveu como estamos vivendo e morreu como ainda iremos.

Não consigo assumir minha cor

Não consigo assumir minha cor porque nunca passei fome. Não consigo assumir minha cor porque não lutei pela terra. Porque não morri em mãos de policial ou fila de hospital. Porque me julgam como "branco dominador". Porque não cresci em tribo, quilombo ou favela. Porque tive ambos os pais, avós e até bisavós. Porque meus sonhos são ambiciosos. Porque desejo ter dinheiro e investir. Tenho sangue africano, tupi e europeu. Sou pardo. Não branco. Minha pele não determina minha moral. Nada diz ela senão que sou fruto dos cantões desse mundo.

Perdido ser

Como parte de um todo universal
Age o homem minério e carnal
Fruto desse conjunto de acasos
Geradores de verdadeiros asnos

Não sabe lidar com tamanho poder
É apóstolo de seu mero parecer
O conjunto de ruínas do universo
Este é o humano, ser perverso

Descobriu em si a transformação
A crescente vontade de um titã 
Porém viu-se preso à razão

Se submete a uma essência sã 
É a singela síntese da infinita ação 
De toda a história, é a imaculada cortesã

Ideia

Como uma luz que pisca
Um vagalume nas trevas
Brilha a ideia e arrisca
por um . afastar as névoas

Desgotosa do incômodo
Toda treva se ilumina
E trata de apagar logo

Foge ao longe, luzinha
Busca onde possas ser sol
Um lugar em que não seja sozinha
Pra se deixar expandir pelo hall

XV

Imposto
Posto
Propõe 
Põe 
Impõe 
Impostor

XVI

Imprensa
Pressa
Presa
Prensa
Impressão

Política

Política é ótica, não ética.
Alguns querem mantes as lentes
e trocar a armação,
Outros amam a armação,
ainda que se troquem as lentes.
Há também quem se desgosta
e troca logo a coisa toda.
Ou aqueles que nem se
metem a pôr um na cara.

Afora isso, as próprias lentes
são exemplo máximo.
mesmo sem enxergar, muitos 
sequer buscam mudança.
Há lentes com grau
extremo ou nenhum.
Qual permite melhor o mundo enxergar?
Ora, lente serve a quem lhe cabe.
Alguns poucos percebem que não
precisam de lente alguma
E passam a ver o mundo 
com os próprios olhos.

Dores

Se dói tanto, por que não quero me curar? Quero ser visto? Notado? Quero ser vítima? Acolhido? Sei que estou com problemas, mas como ter certeza? Até onde sou capaz de sentir?
O desespero me tortura, mas me faz sentir vivo. Como se estivesse implodindo enquanto tento explodir. Como se fosse gigante e ao, mesmo tempo, minúsculo. Como se fosse demônio e, ao mesmo tempo, anjo. Não é tão controverso assim, não é?
Louco? Não... É assim que chamam os sonhadores, e eu não sei se sonho. Tenho medo da viva, não da morte, mas amo a primeira e desprezo a segunda. Esperança faz sofrer, desilusão não. Não me sinto capaz, mas quero lutar. Me sinto acabado, mas não sei desistir. Seja o viver ou morrer, me sinto pressionado a seguir o rumo. Odeio a trilha, mas não consigo desviar dela. Queria fugir, mas não depende só de mim. Não posso abandonar as pessoas, não posso me libertar.

Só lhe dão

Só lhe dão murros
Só lhe dão gritos
Só lhe dão medo
Só lhe dão raiva
Só lhe dão tristeza
Só lhe dão desgosto
Só lhe dão solidão

Poesia?

Como não houvesse poesia
Choram pela discórdia
Deste velho novo mundo.
O profeta tornou moribundo.

Não há mesmo beleza
Se recusam a tristeza
E encaram com frieza
O que merecia sutileza

Ora, o mundo é poesia
O poema nele se cria
N'alma dele é que surge
A tormenta do espírito que urge

XVII

Quando a verdade se torna dor, as piores mentiras tomam forma de remédio.